Apenas 10 meses após a sua nomeação como Diretor Interino do INPE, o interventor, Coronel da Aeronáutica Darcton Policarpo Damião, está prestes a concluir a primeira fase de um projeto de transformação institucional. Em agosto próximo, quando o INPE completará 59 anos, talvez seja também o primeiro aniversário do início de seu fim como o conhecemos. Uma instituição civil, do estado brasileiro e não a serviço de governos, que passou pelos turbulentos anos pré-golpe civil-militar de 1964, produziu com independência e autonomia científica durante todo o período da ditadura e chegou aos anos da redemocratização. Neste período, o INPE construiu espaços de transparência e maior participação de sua comunidade em órgãos colegiados e nas escolhas de seus dirigentes e gestores. A própria escolha do Diretor através de um Comitê de Busca – CB foi um avanço deste período recente.
Seguindo um roteiro atual, as vocações e propostas autoritárias, antidemocráticas e que necessitam do aparelhamento das instituições públicas, vão usar estes mesmos mecanismos, criados no período democrático, para desconstruir o INPE. Em uma primeira fase, reorganizar a estrutura interna, em uma segunda, cortar em pedaços, retendo os setores de interesse para a estratégia militar, na área da defesa e, não se espantem, na área ambiental, onde já temos uma nova militarização da questão amazônica.
O interventor é peça essencial nesta construção. Em um primeiro momento propôs uma reestruturação da instituição sem nenhum critério, técnico ou de gestão, aceitável. Insinuou e mobilizou os setores inpeanos dando a esperança de que a discussão seria ampla, aberta, séria e participativa. Claro que nada disso aconteceu. Uma decisão totalmente autoritária, sem se saber de onde veio, estabeleceu uma nova estrutura de gestão, que está sendo proposta dentro de um novo Regimento Interno que, aliás, deve estar fechado e completo a esta altura. E mais grave, nos últimos dois meses vivemos uma situação peculiar e única no INPE: existe uma estrutura administrativa oficial, a que está no regimento atual e válido, e uma estrutura paralela, que opera, governa e decide sobre o INPE, mas que não existe na regulação administrativa. Parece ate replicar o governo central.
Na reestruturação em curso as Coordenações Gerais atuais são extintas. A Coordenação Geral de Observação da Terra com suas três Divisões não existe mais, neste mundo paralelo do interventor. O CPTEC e o CST também não existem mais, assim como a CEA, a Engenharia e outras. No lugar das Coordenações Gerais surgem quatro grandes “áreas”: Ciências da Terra, Infraestrutura, Espaço e Ensino. Colegas inpeanos foram convidados e aceitaram assumir como gestores desta estrutura paralela. Uma estrutura verticalizada, sem transparência e onde as decisões estão concentradas no interventor com assessoria, principalmente, destes quatro gestores, mas também de um conjunto mais ampliado que assumiu posições na comunicação, nas relações institucionais e em outros postos.
Hoje, os atuais Coordenadores das áreas finalísticas, ainda OFICIAIS na estrutura, não passam de “rainhas da Inglaterra”. Nenhuma decisão ou discussão passa por eles. Só passa pela estrutura verticalizada recém-criada que funciona como apoio subserviente ao interventor. Mais, estes gestores e colegas, conscientemente ou não, estão trabalhando e ajudando na construção do plano de gestão que o interventor pretende apresentar para o CB, em defesa de sua candidatura.
Para o interventor, é óbvio, não há dúvida, de que ele será o escolhido. Com sua estratégia, ele seduziu e cooptou uma significativa parte das lideranças técnico-científicas do INPE. Assim, ele não tem oposição interna. Muitos que poderiam se candidatar ao cargo de diretor não o farão e estão colaborando com a montagem de seu plano. Infelizmente, aceitaram o convite de participar não só de um projeto para o INPE que não foi discutido ou debatido, mas também de uma estrutura paralela de gestão, que transforma seus pares e colegas em despachantes de luxo.
O SindCT, em diversos momentos, tem alertado que o Comitê de Busca designado em março para a escolha de um novo diretor do INPE teria dificuldades em realizar seu trabalho. Ouvimos pesquisadores com reconhecida capacidade para gerir o INPE. Foram unânimes em afirmar que não participariam de um processo seletivo em que um dos candidatos, o interventor, tem manifestado de que será ele o escolhido pelo Ministro Pontes; além, disso, qualquer figura pública, com preocupação com sua biografia, não desejará servir a um governo que tem as mãos manchadas pelos crimes cometidos contra áreas em que o INPE é protagonista, como o monitoramento da Amazônia, as mudanças climáticas, o aquecimento global, o meio ambiente e, sobretudo, pela visão obscurantista demonstrada pelo atual governo em relação ao conhecimento científico. Confirmando a preocupação do SindCT em relação ao CB, o MCTIC acaba de prorrogar o prazo para submissão de candidaturas ao cargo de Diretor(a) do INPE. Anteriormente prevista para 31 de maio de 2020, a data limite para inscrição passa a ser 5 de julho de 2020.
É urgente que esta situação se esclareça. É urgente que nossos colegas, que aceitaram essas novas posições, venham a público, em nossa comunidade, e digam por que estão operando uma estrutura paralela de gestão em conjunto com o interventor. É importante saber deles, destes colegas, pois eles têm o direito, e também o dever, de esclarecer, para a comunidade inpeana, se conhecem e apoiam o projeto do interventor e sua candidatura, uma vez que estes colegas estão operando, em nome do interventor, uma estrutura administrativa que não existe, que não é legal!
Ao fazer isso, estes colegas, que merecem nosso respeito, e o benefício da dúvida, estão colocando aqueles outros importantes colegas que estão nas posições oficiais de gestão, na estrutura legal, em uma posição de imenso constrangimento. Só isso deveria ser motivo suficiente para que estes colegas venham à frente, se mostrem na luz e apresentem suas intenções para com o destino desta instituição que ajudaram a criar, mas que precisam se lembrar de que não fizeram isso sozinhos, longe disso. Se não o fizerem, a história o fará.