Giuseppe Tomasi di Lampedusa foi um escritor italiano do século passado que ficou conhecido por seu romance Il Gattopardo (O Leopardo), sobre a decadência da aristocracia siciliana durante o Risorgimento.
Talvez o trecho mais memorável do livro seja o discurso do sobrinho de Don Fabrizio, Tancredi, o arruinado e simpático oportunista príncipe de Falconeri, incitando seu tio cético e conservador a abandonar sua lealdade aos Bourbons do Reino das Duas Sicílias e aliar-se aos Saboia: “A não ser que nos salvemos, dando-nos as mãos agora, eles nos submeterão à República. Para que as coisas permaneçam iguais, é preciso que tudo mude.” “Il Gatopardo” foi imortalizado no cinema pela direção de Luchino Visconti, estrelada por Burt Lancaster, Alain Delon e Claudia Cardinale, todos atuando em grandes papéis.
Vemos agora, com a publicação da Medida Provisória 980, de 10 de junho, que o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações foi dividido em suas duas componentes originais – C,T&I e Comunicações, contrariando a promessa eleitoral de reduzir o número de ministérios como expediente para economia de recursos, o que todos sabemos ser um objetivo inalcançável, na medida em que as atribuições de estado não são extintas. Mas vamos lá, há algo além disso? Há.
O novo (velho) Ministério das Comunicações será comandado pelo jovem deputado Fábio Faria (PSD-RN), um velho conhecido no Congresso Nacional, menos pelo protagonismo de sua atuação legislativa, do que por seu papel de galã, “modelo” da Dolce & Gabana e colecionador de namoricos, dos quais o que teve maior repercussão aconteceu quando flagrado por usar verba parlamentar para pagar viagem de turismo à sua sogra e à então namorada. Sua carreira de galã-parlamentar por ora está suspensa, desde que casou com uma filha de Sílvio Santos.
Fábio Faria integra o dito Centrão, mais especificamente, o grupo ligado ao ex-ministro Gilberto Kassab, que já comandou a pasta. Do novo ministro o que se pode dizer já foi dito pelo próprio Presidente Bolsonaro, que postou “Vamos ter alguém que não é um profissional do setor, mas tem conhecimento, até pela vida junto à família do Sílvio Santos”. Precisa dizer mais? Não. De quebra, o próprio Presidente coloca o novo ministro em suspeição para assuntos de renovação e concessão de licenças de redes de TV, mas esse é um assunto para outra ocasião.
Mas, temos um novo governo e uma nova política, com suas falsas surpresas, inovações, e uma pitada de lições aprendidas. Desta última, tem-se o aprendizado do ex-ministro Kassab, que assim livrou o Centrão do estorvo da área de Ciência e Tecnologia, com a qual nunca se entenderia mesmo. Fica ela com o atual ministro Marcos Pontes, que entregou os anéis, para não perder o cargo, e que está lidando com o mau humor da comunidade científica com os minguados recursos dedicados à sua pasta e dividirá o ônus com seu colega da Educação: o estrago que a nova Medida Provisória 979 provocará ao alterar as regras de indicação dos Reitores das Universidades Federais; mas essa também é uma outra história, outra inovação.
A inovação maior vem da transferência da Secretaria Especial de Comunicação Social para o novo Ministério das Comunicações. De fato, com isso o Planalto livra-se do Sr. Fábio Wajngarten, que assumirá o posto de Secretário-Executivo da pasta. A inovação é de fato uma confusão: pensar que Comunicação Social tem algo a ver com Comunicações. Certamente não tem, e ter um ministro e um secretário-executivo que não são da área é um erro, e não precisa ser vidente para saber que a SECOM logo voltará para o Planalto, e este Fábio logo voltará a ser um simples publicitário. Mas não será agora; suas gordas verbas publicitárias serão muito, muito úteis mesmo, por ocasião das eleições municipais que se aproximam. Passada essa fase, tudo voltará ao normal.
Mas, e quanto às falsas surpresas? Ora, o grupo do Sr. Kassab terá o controle de estatais como os Correios e a Telebras, além do bilionário Funtel. Nada de novo até aqui. Também terá consigo a Anatel, e seu extraordinário poder sobre as licenças para telecomunicações. Pergunta-se – em tempos de Pandemia e trabalho remoto, haveria “asset” de maior valor real e estratégico para uma nação que comunicações? Certamente não, mas não é somente isso. Além e acima há algo que a maioria ignora, que é a proximidade da decisão governamental quanto ao sistema 5G que será implantado no Brasil, com todos os desdobramentos associados ao seu licenciamento. Trata-se de decisão estratégica, com enorme impacto em nosso futuro, e que envolve negócios bilionários em um país com nossas dimensões. Enfim, o futuro do 5G nas mãos desse grupo político é muito mais que a cereja no bolo, é de fato um diamante já quase lapidado.