“Estabelecemos um compromisso de renegociação dos pagamentos que temos deste mês até o final de 2022 para os próximos anos”, afirmou o pró-reitor de Finanças, professor Eduardo Raupp, ao Conselho Universitário
Devo, não nego, pago quando puder. A expressão popular agora pode ser aplicada à maior universidade federal do país. Em mais um esforço para manter as portas abertas até o fim do ano, a UFRJ negociou a suspensão dos pagamentos para Light e Águas do Rio, que somam R$ 6,5 milhões mensais. A moratória já entrou em vigor nas contas relativas a agosto e vai continuar até dezembro. Os serviços serão mantidos integralmente.
“Estabelecemos um compromisso de renegociação dos pagamentos que temos deste mês até o final de 2022 para os próximos anos”, afirmou o pró-reitor de Finanças, professor Eduardo Raupp, ao Conselho Universitário do dia 8. “Isso vai nos permitir avançar um pouquinho mais no orçamento dos contratos que têm fornecimento de mão de obra. Estamos na expectativa de que setembro venha a ser coberto e alguns contratos de outubro”. Antes do acerto com as concessionárias de luz e água, a instituição só teria condições de bancar as despesas de funcionamento até meados deste mês.
A Lei de Licitações permite aos órgãos da administração pública atrasar pagamentos às empresas contratadas em um prazo de até 90 dias, sem interrupção dos serviços. Em tese, com cobertura orçamentária parcial até outubro, o dispositivo possibilitaria à UFRJ fechar o ano sem sobressaltos, rolando a dívida para 2023. Mas, como o pró-reitor já falou em mais de uma oportunidade, diante da crise econômica, as firmas podem não suportar o período sem recebimentos.
“Entendemos que o quadro segue dramático. Estamos buscando minimizar os problemas de funcionamento em 2022, mas a escassez orçamentária se fará sentir ainda mais cedo em 2023”, afirmou Raupp. “É fundamental que haja recomposição do orçamento atual e do previsto na Proposta de Lei Orçamentária (PLOA) 2023”.
A PLOA do ano que vem, ainda em discussão no Congresso, também não é nada promissora. Serão apenas R$ 321,1 milhões — R$ 8,1 milhões a menos que o deste ano.
A publicação da proposta do governo para 2023 apresentou um aumento de R$ 200 mil em receita própria, item que chegaria a R$ 57 milhões. A verba representa tudo que a universidade é autorizada a gastar a partir de aluguéis de seus espaços, por exemplo. O problema é que o governo impõe um limite neste gasto e recolhe o excedente. “Agora já estamos em R$ 45 milhões, que era o limite para o ano todo. Com o corte, o teto ficou limitado a R$ 33 milhões. Ou seja, temos R$ 12 milhões de superávit que não podemos usar”, disse o pró-reitor.
A UFRJ tenta com o MEC a liberação desse superávit. “Este valor nos permitiria pagar os contratos de outubro. Mas, até o momento, não temos nenhuma sinalização neste sentido”, completou Raupp.
MOÇÃO CONTRA MP Nº 1.136
Na sessão do dia 8, o Consuni da UFRJ aprovou uma moção contra a Medida Provisória nº 1.136, que bloqueia recursos do Fundo Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). A MP, editada para o governo atender ao teto de gastos públicos, tem reflexos até 2026. E seus efeitos são imediatos: dos R$ 9 bilhões orçados para o fundo em 2022, somente poderão ser usados R$ 5,5 bilhões. Deste total, somente a metade é destinada às universidades e institutos de pesquisa. Os outros 50%, conforme já noticiou o Jornal da AdUFRJ, ficam à disposição do financiamento de pesquisas nas empresas, por empréstimo. Estes recursos, reembolsáveis, ficam parados no FDNCT e acabam recolhidos ao Tesouro, no fim do exercício fiscal. “Há vários editais na praça, tanto por parte da Finep, como do CNPq. Estamos preocupados, pois muitos destes editais não poderão ser pagos diante desta restrição de recursos”, explica a vice-presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, professora Fernanda Sobral. No ano que vem, o bloqueio será de 42%; em 2024, de 32%; em 2025, de 22%; e em 2026, de 12%.
Em todo o país, os cientistas protestam contra mais esta investida no FNDCT, que deveria estar protegido de qualquer tipo de corte pela Lei Complementar nº 177, de 2021. Apesar disso, o governo insiste em desrespeitar a legislação, o que prejudica o planejamento dos gestores da área. “Foi votada a lei complementar para não permitir contingenciamento. O governo vetou. Nós conseguimos que o Congresso derrubasse o veto do presidente. Depois, foram bloqueados R$ 2,5 bilhões. Conseguimos o desbloqueio. E agora vem essa MP. Ou seja, a gente nunca sabe com quanto vai poder contar de fato para a Ciência”, afirma Fernanda.
O mais novo ataque ao principal fundo de apoio à Ciência do Brasil a poucos meses do fim do governo Bolsonaro não chegou a surpreender a professora. “Esta secundarização da Ciência está ocorrendo desde o início do governo”.