Servidores públicos federais têm relatado ao SindCT estarem recebendo, semanalmente, e-mails provenientes da Corregedoria do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação – MCTI, para que se lembrem do novo manual de conduta dos agentes públicos. Agem como se não existisse o Regime Jurídico Único e o Código de Ética do Servidor Público a orientar a prática do Serviço Público.
Todas as semanas vem um recadinho da Corregedoria. Uma mensagem com aparência simpática, mas intrinsicamente desrespeitosa, e que representa assédio moral aos servidores, como se precisassem ser sempre lembrados de suas obrigações funcionais, de seus deveres institucionais, como se todos estivessem a ponto de cometer um delito.
Mas as mensagens têm um viés “interessante”, como nos exemplos abaixo:
Grande parte desses informes representa uma ameaça velada sobre divulgação de informação considerada confidencial. Mas quem decide o que é confidencial? Será que esses informes da corregedoria são confidenciais e endereçados apenas aos funcionários? Será que o funcionário que questiona o envio desse tipo de mensagem e o classifica como assédio está cometendo um crime por transferir essa “informação” ao público? Há sempre expressões de alerta: Fique atento! Mas cuidado!
Mas agora, quando as eleições municipais se aproximam, o recado, certamente, é para que os agentes públicos não usem seu cargo para promover interesses de partidos políticos.
Todos esses recados fazem parte do “Manual de Conduta do agente público civil do Poder Executivo Federal”, publicado pelo governo Bolsonaro este ano, e disponibilizado para os agentes públicos na primeira mensagem.
O manual foi redigido reutilizando leis já existentes com normas que regem o serviço público e que os servidores conhecem bem.
O conteúdo dessas mensagens tem assustado servidores, pois o induzem a acreditar que ele não poderia pedir votos ou participar de campanhas políticas.
Na realidade, as leis impedem apenas o uso do CARGO público para tais fins, não a participação pessoal do servidor em campanhas políticas. De forma quase ameaçadora, o Manual de Conduta lista dezenas de condutas que serão consideradas inadequadas, muitas das quais foram praticadas pelo próprio presidente da República, a quem o manual, infelizmente, não se aplica. Como publicado pela imprensa hoje, essas regras não se aplicam ao presidente por não ser ele agente público, mas sim… político. Porém se aplica aos funcionários que o acompanham em suas lives e que fazem a transposição de suas falas para a linguagem de Libras. O que a corregedoria tem a falar sobre isso? Não está na esfera do MCTI cuidar do assunto? Pois todo servidor público que se abstém de relatar ou apontar desvios de função pode ser enquadrado no crime de prevaricação.
A sugestão do SindCT é que esse código seja estendido aos “agentes políticos” (presidente, vice-presidente e parlamentares) que aparentemente podem tudo nesse país em que o equilíbrio entre os poderes é mantido apenas para todos usufruírem de seus podres poderes. Se fôssemos examinar o comportamento do nosso inominável presidente, ele sim precisaria receber semanalmente os recadinhos da Corregedoria.
A seguir, apresentamos algumas condutas do Manual que foram infringidas pelo presidente da República:
5 – Condutas Inadequadas:
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“Item b) prejudicar, deliberadamente, outros agentes públicos ou cidadãos, sem a existência de elementos probatórios;” – Bolsonaro demitiu o diretor do INPE, Ricardo Galvão, e exonerou a Coordenadora de Observação da Terra do INPE, Lubia Vinhas, porque discordou, sem comprovação científica, dos dados de desmatamento apresentados pelo instituto.
“Item f) permitir que interesses ou conceitos de ordem pessoal, corporativistas ou político-partidários interfiram no trato com o público ou com qualquer agente público;” – Bolsonaro tenta impedir as investigações da polícia federal sobre denúncias de peculato, praticado por seu filho, Flávio Bolsonaro.
“Item g) solicitar, provocar, sugerir ou receber ajuda financeira, gratificação, prêmio, comissão, doação ou vantagens indevidas, para si, familiares ou qualquer pessoa, para o cumprimento das suas atribuições;” – Bolsonaro criou, na presidência da República, ao lado do seu, um gabinete para seu filho, Carlos Bolsonaro, que atua como vereador no Rio de Janeiro.
Condutas a serem evitadas:
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“Item g) impedir, dificultar ou atrasar, pelas prerrogativas do cargo que ocupa, qualquer formulação ou mudança de política pública, legislação, arranjo institucional ou plano de cargos e salários referente à categoria ou carreira pública da qual faça parte o titular do cargo ou seu cônjuge, descendentes ou ascendentes;” – Bolsonaro faz campanha antivacina, tenta barrar os testes com a vacina contra o corona vírus e realiza propaganda de remédio cientificamente comprovado ser ineficiente.
O manual de conduta não foge à regra básica do Brasil: dois pesos e duas medidas. Quando o presidente manda, os sabujos obedecem, e não cumprem o código, voltam atrás em suas palavras, transformando o Brasil numa anarquia burlesca, em que até um general indemissível se apequena.