A ex-coordenadora do setor do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Especiais) responsável por monitorar o desmatamento na Amazônia disse se incomodar com a narrativa de que o órgão atua contra o governo. Lúbia Vinhas também disse que precisa ser comunicado que o “dado não vai ser bonitinho e ele vai aparecer”.
As declarações foram dadas em transmissão ao vivo promovida pela Ascema (Associação Nacional de Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente), na noite desta terça-feira (28).
Vinhas foi questionada sobre a falta de comunicação entre os órgãos de combate aos crimes ambientais, particularmente entre o Inpe e o Ibama –ligado ao Ministério do Meio Ambiente. A servidora afirma que esse diálogo foi sendo reconstruído entre os técnicos, apesar de mudanças nos dois órgãos.
“Não é no nível técnico [essa falta de comunicação], acho que é no nível de alertar o governo de que esse dado não vai ser bonitinho e ele vai aparecer”, disse a ex-coordenadora-geral de Observação da Terra.
“Acho que uma das coisas difíceis da gente no Inpe engolir é essa narrativa de ‘ah, o dado é ruim para o Brasil e vocês estão divulgando ele na imprensa. Por que não avisa o governo?’. Na minha opinião, é nesse sentido que a falta de comunicação aconteceu. Não é entre técnicos e técnicos”, afirmou.
“Me doi um pouco essa narrativa de que estamos jogando contra o governo, dando uma informação para atrapalhar o governo, enquanto que a única coisa que a gente faz é ser transparente para que tenhamos credibilidade”, disse.
Vinhas foi exonerada dias após a divulgação de dados que mostravam um novo avanço do desmatamento na região da Amazônia. Assim como nos momentos após sua saída, a ex-coordenadora afirmou que não achava que a mudança tinha relação com as informações divulgadas e sim que fazia parte da reestruturação do órgão –versão oficial divulgada pelo ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Marcos Pontes.
A ex-coordenadora afirmou saber que seria exonerada, pois o plano de reestruturação previa a extinção de seu cargo. No entanto, foi pega de surpresa com a publicação naquela data da sua saída no Diário Oficial da União.
Vinhas foi comedida em suas falas a respeito das políticas do governo no combate aos crimes ambientais, ao contrário dos demais participantes. O título da live era “desmonte da gestão ambiental e o aumento do desmatamento no Brasil: o papel do monitoramento e da fiscalização ambiental”.
O também servidor de carreira do Inpe Antonio Miguel V. Monteiro afirmou ser “zero” a perspectiva de uma gestão ambiental feita a partir do governo federal.
Monteiro criticou o plano de reestruturação do Inpe, no qual se impõe um sistema “verticalizado” de hierarquia entre os órgãos internos.
“Reestruturação implica numa verticalização, menos gente participando das decisões, portanto mais dificuldades que você possa se contrapor, que possa haver opiniões dissonantes”, afirmou.
Os outros dos participantes, ligados ao Ibama, mencionaram as mudanças na estrutura nos órgãos ligados ao meio ambiente, com a extinção de parte significativa de unidades e conselhos que tratavam de questões ambientais. Ambos também mencionaram a redução no número de servidores, o que vem afetando o trabalho.
O ex-coordenador geral de monitoramento e informações ambientais do Ibama George Porto Ferreira também mencionou falas do presidente Bolsonaro, que dão a entender que a “Amazônia é um quintal a ser explorado” e que o “Ibama é uma indústria da multa”.
“Para reduzir desmatamento, é preciso um plano sério e parar de dar sinais de que nada via acontecer com quem desmatar”, disse.
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