As taxas de desmatamento da Amazônia e a última fronteira
As taxas de desmatamento da Amazônia e a última fronteira

As taxas de desmatamento da Amazônia e a última fronteira

No dia 30 de novembro, na presença do Vice-presidente Hamilton Mourão e do Ministro da Ciência, Tecnologia e Inovações, Marcos Pontes, o INPE divulgou a primeira estimativa da taxa de desmatamento do PRODES para a Amazônia Legal, do ano de 2020. A taxa divulgada foi de 11.088 km2, que representa um aumento de 9,5% em relação a taxa de 2019, estimada em 10.129 km2. Essa primeira estimativa é feita tendo como base áreas definidas como prioritárias, onde ocorrem as maiores dinâmicas de desmatamento observadas nos últimos anos, entre outros critérios. O mapeamento completo e a estimativa consolidada são finalizados no segundo semestre do ano seguinte, apresentando uma variação de até 4% para mais ou para menos.

Durante o evento de divulgação da taxa, foi mencionado que se especulava um aumento em torno de 20%, o que não se confirmou com os dados apresentados. Ao estabelecer esse elevado patamar de aumento na taxa de desmatamento, sem base em dados concretos, a diferença de 9,5% de aumento da atual taxa pode parecer pequena e pouco relevante. Porém, não podemos nos deixar enganar por esse artifício, o aumento apresentado é bastante significativo e sinaliza a falta de eficácia nas ações de controle e combate ao desmatamento. Em relação à taxa de 2019, a diferença foi superior a 1.000 km2, o que não é pouco. Somado a isso, a taxa de desmatamento tem se mostrado crescente e, desde de 2019, tem se mantido em um patamar elevado, atingindo mais de 10.000 km2, sendo o aumento entre 2018 (7.536 km2) e 2019 (10.129 km2) de cerca de 34%, o mais elevado desde 2012.

As taxas de desmatamento não devem ser avaliadas de forma isolada, é preciso observar a série histórica iniciada em 1988 e suas tendências. Esses dados podem ser acessados clicando aqui. Na série histórica observa-se que, desde 2012, há uma tendência de aumento crescente nas taxas de desmatamento, que se acentuou nos dois últimos anos. Desde 2008 não se observa uma taxa tão alta como a de 2020, indicando que as atuais políticas e ações de controle do desmatamento podem não estar produzindo os resultados desejados. O início tardio das operações de fiscalização em 2020 não é suficiente para explicar essa taxa. A atuação tardia, associada à desarticulação do sistema de combate ao desmatamento, à paralisação de operações e à desativação de programas como o PPCDAM (Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal), que operava desde 2004, apresentando resultados efetivos no combate ao desmatamento desde sua implementação, formam um quadro importante que define uma nova e preocupante fase de vulnerabilidade institucional na resposta ao desmatamento.

Com relação à taxa de 2020, é necessário observar que grande parte das áreas desmatadas e queimadas detectadas pelo sistema de alertas do INPE em 2020, o DETER (Detecção do Desmatamento em Tempo Real), não entrou no cômputo da taxa de 2020, pois a taxa é anualizada para o período de agosto do ano anterior até julho do ano corrente, sendo o dia 1º de agosto a data de referência. Dessa maneira, parte dos desmatamentos que ocorreram no segundo semestre de 2020 só será computada no ano seguinte, o que pode significar a manutenção ou o aumento das altas taxas de desmatamento em 2021, caso as ações de comando e controle não sejam repensadas.

As atuais estimativas apontam o estado do Pará com a maior taxa de desmatamento, representando aproximadamente 47% (5.192 km2) das perdas totais de floresta da Amazônia Legal. Em segundo lugar, temos o estado do Mato Grosso com 16% (1.767 km2) e, em terceiro, o estado do Amazonas com 14% (1.521 km²). A leitura adequada destes números é essencial para planejar as ações necessárias de contenção emergencial. O Estado do Amazonas, por exemplo, é o que apresenta a maior área contínua e íntegra de floresta dos estados que compõem a Amazônia Legal, porém, nos últimos anos, tem apresentado uma curva crescente nas taxas de desmatamento. Em 2019 apresentou um aumento de 37% (1.434 km2) em relação a 2018 (1.045 km2) mantendo-se neste patamar, com uma taxa de 1.521 km2 em 2020. Esse dado é preocupante e nos mostra o avanço da fronteira de ocupação na Amazônia Legal rumo às regiões mais isoladas, chegando ao seu coração, por estradas e rios da porção sul do estado do Amazonas. Para evitar que isso ocorra, as ações de combate ao desmatamento devem ser efetivadas rapidamente, não podendo permanecer míope para as mais diversas atividades ilegais que ocorrem neste vasto território, como: mineração, exploração madeireira, grilagem de terras, queimadas, invasão de terras indígenas e de unidades de conservação, além das atividades legais ou legalizadas que, associadas às atividades ilegais, formam uma cadeia do desmatamento que possibilita a lavagem das ilegalidades de origem. Esse quadro nos leva a concluir que, se não controlarmos a expansão dessas atividades geradoras de desmatamento, romperemos as últimas fronteiras da Amazônia, o que pode nos levar a um caminho sem volta, em um futuro próximo.

Autores

  • Tecnologista Senior do INPE servidora do INPE e coordenadora do Laboratório de Investigação Sócio Ambiental (LiSS). Possui mestrado e doutorado em Sensoriamento Remoto INPE. Colabora com o Programa de Monitoramento de Floresta da Amazônia, entre outros projetos e programas.

  • Tecnologista Sênior do INPE onde Coordena o LiSS - Laboratório de investigação em Sistemas Socioambientais. Possui DPhil em Engenharia Eletrônica e Controle / Ciência da Computação e atua como professor e supervisor em três Programas de Pós-Graduação do INPE: Sensoriamento Remoto, Ciência da Computação Aplicada e Programa de Pós-Graduação em Ciências do Sistema Terrestre.