Diretor do INPE desconhece a função do DETER
Diretor do INPE desconhece a função do DETER

Diretor do INPE desconhece a função do DETER

Da Redação

A conta do INPE no Twitter (@inpe_mct) publicou, no dia 14/12/2021, a seguinte mensagem: “Integração entre as forças de segurança e órgãos ambientais reduz em 19% desmatamento na Amazônia”.

A publicação remete a uma página do Ministério da Justiça e Segurança Pública, onde se lê: “As ações integradas realizadas pelo Governo Federal para combater os crimes ambientais contribuíram para uma queda de 19% no desmatamento na Amazônia em novembro, em comparação com o mesmo mês do ano passado. Os dados do Deter-B, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, registraram a menor área de alertas de desmatamento na região desde o início da série histórica, iniciada em 2015. A área desmatada em novembro de 2021 ficou em 249 km². No mesmo mês de 2015, foram registrados 302 km² de desmatamento”.

Tal informação não está na página oficial do INPE, mas como a conta do Instituto no twitter é de responsabilidade da sua direção, supõe-se que o atual Diretor seja o responsável pela disseminação da referida postagem.

Não seria exagero admitir-se que o detentor do cargo máximo do INPE conheça as ações desenvolvidas na instituição. Também não seria exagerar na premissa do Diretor ter ouvido falar do sistema DETER. Mas é óbvio que ele parece não entender a finalidade deste importante mecanismo que, até o dia 13 passado, servia como um sistema de alerta e suporte à fiscalização.

Se o Diretor desse uma pausa em sua autopromoção, gravando vídeos e postando fotos de como é bem recebido nos bastidores deste governo negacionista e contrário à Ciência, talvez pudesse ao menos dar uma passada de olhos no documento oficial do INPE mais atualizado sobre a metodologia empregada em seus sistemas de monitoramento (Metodologia para Monitoramento da Floresta usada nos projetos PRODES e DETER. São José dos Campos: INPE, versão: 2021-01-26. IBI: <8JMKD3MGP3W34R/443GTAS>. Disponível em:

<http://urlib.net/rep/8JMKD3MGP3W34R/443GTAS> ).

Leria então, o Diretor, na página 21: “O INPE enfatiza que o DETER é um sistema expedito de alerta desenvolvido metodologicamente para suporte à fiscalização. A informação sobre áreas é para que as entidades responsáveis pela fiscalização possam identificar áreas prioritárias para fiscalização e não deve ser entendida como a taxa mensal de desmatamento. O número oficial do INPE para medir a taxa anual de desmatamento por corte raso na Amazônia Legal brasileira é fornecido, desde 1988, pelo projeto PRODES que trabalha com imagens de melhor resolução espacial.”

A razão para isto é simples. O DETER utiliza satélites com sensores óticos e a área efetivamente coberta por eles depende da situação das nuvens no momento da passagem do satélite. Coberturas de nuvens altas impedem que o satélite “veja” a área naquela passagem.

O DETER só usa uma passagem, pois é um sistema expedito e pensado para fiscalização. Então a porcentagem de cobertura de nuvem naquela passagem é um dado muito importante. Como esta cobertura varia a cada passagem, quando se tenta agregar um dado mensal, este dado traz em si esta característica. Por exemplo, a cobertura de nuvens esse ano foi de 30,3%, enquanto ano passado foi de 5,54% (FONTE: TerraBrasilis. Plataforma web desenvolvida pelo INPE para acesso, consulta, análise e disseminação de dados geográficos gerados pelos projetos de monitoramento da vegetação nativa do instituto como o PRODES e o DETER. TerraBrasilis – DETER Avisos [http://terrabrasilis.dpi.inpe.br/app/dashboard/alerts/legal/amazon/aggregated/]. Acessado em 15 de dezembro de 2021.)

No passado, o DETER “viu” muito mais que este ano no mesmo mês! Então sobre esse valor baixo em novembro, na verdade, nada podemos dizer sobre taxas!!!

Interessante observar também que o ministro (do Meio Ambiente), que na fase de preparação para a COP26 não “teve tempo” para se inteirar dos dados de desmatamento do último relatório PRODES, desta vez não apenas teve tempo de ler, como também de dar entrevista coletiva no dia 14 de dezembro, acompanhado do ministro da Justiça, para anunciar a “boa nova”, que está mais para “boa nova fake news”. Quanto ao outro ministro responsável, o da Ciência e Tecnologia, aquele que estava “em férias” antes da COP26, parece que está saindo em férias novamente, como noticiado esta semana, mas com este sabemos que não podemos mesmo contar para nada. O triste mesmo é saber que eles podem, sim, contar com o Diretor do INPE para ajudar a disseminar este tipo de notícia, sem as ressalvas que se esperaria de um órgão técnico.

Leigos podem errar nesta interpretação; jornalistas devem investigar a afirmação que o DETER foi utilizado de forma incorreta para o Governo anunciar a queda da taxa de desmatamento em 2021. Mas o Diretor do INPE não tem esta prerrogativa, haja vista que tem à sua disposição uma competente equipe técnica, que com um simples telefonema poderia informá-lo de cometer um erro técnico, ao confundir a medida MENSAL de alertas com uma ideia da TAXA MENSAL de desmatamento.

A propósito, a área técnica do INPE, responsável pelo programa de monitoramento de desmatamento da Amazônia e outros biomas, enviou no dia 19/11 ao Diretor, via SEI, uma Nota Técnica sobre a consistência dos sistemas de monitoramento e degradação florestal do INPE, enfatizando as diferenças entre o DETER e o PRODES e suas respectivas metodologias e finalidades. Esse documento foi acompanhado de um pedido formal de publicação na página oficial do INPE. No mesmo dia, o Diretor deu um comando de ciência no processo, indicando que teve acesso ao seu conteúdo. Entretanto, além de não publicar a referida Nota Técnica, após quase um mês de ser recebimento, o Diretor publica uma fake news, em nome do INPE, para sustentar a posição negacionista de um governo ecocida, em total contrariedade ao que defendem os cientistas do órgão que comanda e contribuindo de forma direta e decisiva para a destruição do principal ativo do INPE: a sua credibilidade.

Para o bem do INPE e dos servidores que a ele se dedicam e se dedicaram ao longo de seus 60 anos de existência, queremos crer que o Diretor tenha se enganado. Pois, se este não for o caso, estaremos diante de mais uma autoridade do Governo Bolsonaro, que ignora a Ciência e faz uso de falsas informações para alimentar a sua matula de seguidores.