Donald Trump insiste em se apresentar como um negacionista das mudanças climáticas. Mas eu tenho minhas dúvidas. Anunciou para quem quisesse ouvir durante a campanha que o aquecimento global tal como estudado por mim e
milhares de cientistas ao redor do planeta durante as últimas décadas é um “hoax”, ou seja, uma farsa.
Verdade seja dita, Trump age como se não houvesse perigo algum à vista para o clima ou para a humanidade. Em seu primeiro mandato (2017-2020), retirou os Estados Unidos do Acordo de Paris, o tratado global para deter o aquecimento na medida do possível. Nos três últimos anos desse período, as emissões de gases de efeito estufa (GEE) no país aumentaram.
De volta ao poder, Trump retirou novamente o país do Acordo, para o qual o país tinha voltado durante o governo Biden. A participação dos Estados Unidos no Acordo de Paris tem algo de um jogo de pingue-pongue, vai e volta. Tanto um lado como o outro parecem levar a sério ao menos o valor simbólico do acordo.
Desde o início de seu segundo mandato, Trump autorizou grande número de pedidos para exploração de petróleo e gás natural e cortou amplamente o que o governo estadunidense investia em transição para energias renováveis. Neste mês, ordenou que todos os carregadores de veículos elétricos em prédios federais fossem desligados.
Negacionistas são aqueles que não acreditam que mudanças climáticas estão acontecendo ou não acreditam que elas podem trazer riscos para a humanidade.
Muitos deles falam que os eventos extremos do clima sempre existiram. Essa é sempre uma posição anticientífica.
O negacionismo de Trump parecia inquestionável até ele colocar Elon Musk, o homem mais rico do planeta, como seu braço direito, chefiando o Departamento de Eficiência Governamental (DOGE, cuja pronúncia varia conforme a opinião política).
Musk fez sua fortuna com carros elétricos da marca Tesla. A empresa já vendeu mais 7 milhões de automóveis cuja principal característica é prescindir de combustíveis, como gasolina ou diesel.
Além de automóveis, a Tesla vende baterias para residências e indústrias, usadas para armazenar e gerenciar a energia gerada por fontes renováveis, como painéis solares e turbinas eólicas.
Obviamente, nos Estados Unidos, a recarga de veículos elétricos ainda depende, em grande parte, de eletricidade gerada por combustíveis fósseis. No entanto, esses carros ajudam a reduzir as emissões, pois não queimam gasolina, diesel ou gás natural, principais combustíveis do transporte global.
E por que o presidente Trump deu tanto poder a Musk?
Após a eleição para o segundo mandato, Trump começou incluindo a expansão do domínio político e geográfico dos Estados Unidos. Ele afirmou que pretende transformar o Canadá em um estado americano e incorporar a Groenlândia ao
território dos EUA, dizendo que vai negociar um acordo com a Dinamarca, que atualmente controla a região. Além disso, destacou que o derretimento do gelo no oceano Ártico abrirá novas rotas marítimas para China e Rússia, permitindo o transporte de navios para a Europa e as Américas sem a necessidade de cruzar o oceano Pacífico ou o Canal do Panamá.
Desde a eleição e a posse ele insiste no tema. Então, o que nós podemos concluir?
Podemos concluir que o presidente sabe o que está acontecendo, sabe que o aquecimento global está causando os atuais eventos extremos – ondas de calor, secas extremas e, principalmente, o derretimento do gelo.
Uma das razões de a temperatura ter atingido a máxima histórica em 2024, e que continua no início de 2025, foi o derretimento do gelo do oceano junto à Antártida e no Ártico, onde a temperatura já subiu de 3°C a 4°C em função disso. O mar de gelo reflete de 50% a 60% da radiação solar, enquanto a água do oceano reflete apenas 6%, e, consequentemente, aquece.
Parece que o presidente Trump quer o aquecimento global e que ele acelere .
O desejo de Trump inclui o desaparecimento do gelo no Ártico, a redução significativa das geleiras no Canadá e o derretimento de parte dos mantos de gelo da Groenlândia para facilitar a exploração de petróleo e minérios. Essa deve ser a razão por trás de sua defesa para acelerar a exploração de combustíveis fósseis lançando uma grande quantidade de GEE na atmosfera.
A ciência já alertou: se a temperatura global ultrapassar 2°C acima dos níveis pré-industriais, o Ártico pode ficar praticamente sem gelo em grande parte do fim do verão do hemisfério Norte.
E aí entra Elon Musk e seu departamento de eficiência. Só falta o presidente colocar o empresário para criar e implantar um inovador mercado pró-carbono. Em vez de recompensar quem reduz emissões, ele penalizaria o uso de energias renováveis. Quem optar por fontes limpas teria que pagar um crédito de carbono pelo CO2 que deixou de emitir. E esse dinheiro seria transferido para setores que
exploram petróleo e produzem combustíveis fósseis, garantindo a aceleração do degelo e o acesso aos recursos minerais no Canadá e na Groenlândia.
Sem contar a insistência de um acordo comercial por minérios da Ucrânia como preço da paz com a Rússia. Aparentemente, o presidente quer uma superaceleração do aquecimento global.
O planeta está à beira de inúmeros pontos de não retorno, os chamados “tipping points”. Agora, o presidente dos EUA quer criar o primeiro ponto de não retorno sociopolítico, o “Trumping point”.